O Terceiro Encontro de Paulo com Pedro - Cap. 2:11-21

Os difamadores de Paulo também alegavam que ele não possuía autoridade como um apóstolo. Paulo responde a isso mencionando outro acontecimento quando ele havia se encontrado com Pedro. Paulo mostra que tinha autoridade suficiente para repreender aquele que era reputado como o principal apóstolo. Ao mesmo tempo, Paulo lida com a questão que dizia respeito a crentes judeus, se deveriam ou não guardar a lei. O acontecimento anterior havia mostrado que crentes gentios não deveriam ser colocados sob a lei (vs. 1-10), mas a questão ainda permanecia quanto aos crentes judeus, se deveriam estar debaixo dela. Essa questão é endereçada no terceiro encontro com Pedro onde Paulo mostra, conclusivamente, que crentes judeus também não deveriam estar debaixo da lei.
Vs. 11-13 – Algum tempo depois do concílio de Jerusalém de Atos 15, Pedro foi à Antioquia e encontrou os crentes judeus comendo livremente com os crentes gentios. Ele sabia que esta era a ordem de Deus e ajuntou-se a eles, porque “a parede de separação que estava no meio” de judeus e gentios havia sido derrubada (Ef 2:14). Mas quando chegaram certos homens de Jerusalém, da parte de Tiago, Pedro “se foi retirando, e se apartou deles, temendo os que eram da circuncisão”. Outros, incluindo “Barnabé”, se deixaram “levar pela sua dissimulação”. Pedro sustentou a verdade do evangelho em palavra no concílio em Jerusalém (At 15:7-11), mas, na hora de praticá-la, Pedro fez o contrário. Ele falhou ao negar a verdade que ensinava pela sua conduta. Algumas Bíblias traduzem “dissimulação” como “hipocrisia” – e isso é exatamente o que estava acontecendo. A raiz da falha de Pedro estava em que ele queria ter sido considerado por aqueles que tinham reputação em Jerusalém. Ele temeu perder o respeito deles e isto o levou a dissimular. O fato de que ele possuía a posição de um apóstolo fazia da ofensa algo muito mais sério. Quanto mais um homem é honrado, tanto maior pedra de tropeço ele será para outros se vier a falhar. Foi exatamente isso que aconteceu: “E os outros judeus dissimulavam com ele, de maneira que até Barnabé se deixou levar”. O livro de Provérbios diz: “O receio do homem armará laços” (Pv 29:25). Pedro certamente caiu nesse laço e isto o levou a comprometer princípios.
V. 14 – Isso precisava ser tratado imediatamente. Paulo percebeu que a verdade do evangelho estava em jogo, talvez de uma maneira mais séria do que Pedro percebia. Uma falha pública – especialmente uma que influencia e afeta outros – requer uma repreensão pública (1 Tm 5:20). Paulo, portanto, perguntou a Pedro diante de todos: “Se tu, sendo judeu, vives como os gentios, e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como judeus [a se judaizarem – JND]?” Ao recusar-se comer com os crentes gentios sua ação implicava em que, para a santidade, eram necessárias as observâncias dos costumes e das leis judaicas. E se isto fosse verdade, então depois de tudo, os gentios precisariam de fato estar debaixo da lei para que pudessem estar adequados para a comunhão com crentes judeus. Com efeito, Pedro, por meio de suas ações, estava compelindo os gentios a se “judaizarem”. Este era o mesmo erro que os mestres judaizantes estavam propagando na Galácia e, portanto, a repreensão de Pedro feita por Paulo continha uma repreensão implícita para os gálatas.
Pode parecer como algo pequeno simplesmente recusar comer uma refeição comum com crentes gentios, mas no fundo disso a “verdade do evangelho” estava sendo comprometida, e haveria grandes consequências práticas que colocariam em perigo a comunhão dos santos. Se as ações de Pedro seguissem sem que fossem contestadas, um círculo interno dentro da comunhão dos santos teria se desenvolvido – um tipo de aristocracia entre os irmãos. Criar-se-ia uma igreja dentro da Igreja. Isso implicava que existia algo como santidade e posição espiritual superiores entre os santos, e se os santos gentios quisessem ser admitidos neste círculo, teriam que se judaizar e obedecer aos requerimentos de Moisés. Isso é o que legalismo entre Cristãos frequentemente produz – um grupo de elite se desenvolverá dentro da comunhão dos santos. Tratava-se de algo divisório que precisava ser abordado imediatamente.
Pedro sabia muito bem disso porque o Senhor havia ensinado o contrário a ele quando estava no terraço de Simão, o curtidor. O Senhor havia a ele dito: “Não faças tu comum ao que Deus purificou” (At 10:15). Como todos às vezes fazemos, Pedro não viveu à luz da verdade que conhecia. Sua conduta revelava uma persistente convicção de superioridade dos judeus sobre os gentios. Isso mostra que enquanto os judaizantes haviam sido derrotados no concílio dos apóstolos em Jerusalém, a respeito de acrescentar a lei ao evangelho, o fermento do legalismo ainda estava operando na Igreja Cristã.
Vs. 15-18 – Nos versículos restantes do capítulo, Paulo registra um resumo de sua argumentação com Pedro quanto à lei em relação ao crente (A maioria dos expositores assumem que os versículos de 15 a 21 foram ditos a Pedro). Isso é apresentado aqui porque declara a própria essência de sua doutrina e atua como uma introdução para os próximos capítulos (3-4), onde ele expõe a verdade da justificação.
Paulo fez a Pedro uma segunda pergunta que expunha ainda mais a inconsistência de seu comportamento. Ele disse: “Nós, judeus por natureza, e não pecadores das nações, mas sabendo que um homem não é justificado sobre o princípio de obras de lei, mas pela fé de Jesus Cristo, nós também temos crido em Cristo Jesus, para sermos justificados sobre o princípio da fé de Cristo; e não de obras de lei; porque sobre o princípio de obras de lei nenhuma carne será justificada. Agora se ao procurarmos ser justificados em Cristo, nós somos também achados pecadores, é então Cristo um ministro de pecado?” (Gl 2:15-17 – JND). O ponto de Paulo aqui é que, se Pedro estava correto ao retornar à lei, então Cristo o havia guiado incorretamente ao recusar a lei em Atos 15. Mas isso era impossível; o Senhor não guiaria uma pessoa a fazer ambas as coisas. Paulo pergunta a Pedro: “Você está dizendo pelas suas ações que Cristo é um “ministro de pecado”? Paulo repele tal conclusão dizendo; “de maneira nenhuma”. O verdadeiro pecador ou transgressor não era Cristo, mas Pedro! Qualquer que fosse correto – abrir mão da lei ou retomá-la – uma coisa era certa, Pedro estava errado em um dos dois casos. Se Pedro estivesse certo agora (em retornar às observâncias legais), então suas ações anteriores estavam erradas. Se suas ações anteriores estivessem corretas, então ele estaria errado agora. Em qualquer um dos casos, ele permanecia como um transgressor.
Além da verdade aqui em questão, esta passagem efetivamente refuta a noção de que Pedro era o líder infalível da Igreja, como os católicos romanos ensinam. Pedro claramente errou aqui. Há uma lição para nós nisto: não devemos supor que pelo fato de um homem ser um líder em meio ao povo do Senhor, e honrado, que ele está sempre certo. Líderes também podem falhar.